As referências como fuga do autoconhecimento
Existem
três grandes demandas que determinam a referência de uma pessoa. A primeira
delas é “ser o que os outros querem que ela seja”. Trata-se de alterreferência, assim sendo, alterrreferência é o ato de tomar o outro como referência para
o autoconhecimento.
Nesta
dinâmica o individuo dedica toda a sua vida – em alguns casos, desde a infância
– a atender âs expectativas dos outros: cônjuge, pai, mãe, irmãos, avõs,
chefes, professores, pastores e etc. Neste sentido, o que dá significado à vida
é se tornar o que os outros querem que sejamos e isto pode demorar uma vida
inteira, sendo esta vida totalmente dedica uma realidade inautêntica. Esta inautenticidade gera uma amarga decepção
ao se descobrir que tudo foi em vão. Fruto disto é a culpa e a vergonha, o trágico
é que quase sempre é impossível remediar as consequências das escolhas inautênticas.
A
segunda grande demanda que determina a referencia de uma pessoa surge quando
ela diz: “Basta! Agora sere o que eu
quero ser”. Trata-se de egorreferência.
Podemos conceituar como o ato de tomar a própria expectativa de si como
referência para determinação da identidade. A pessoa tira seu “tirano” que é a
necessidade de aceitação dos outros e troca por outro “tirano”, onde parte em
buscar de ser o seu “verdadeiro” eu mas já não tem referencia alguma de si próprio
caindo na vala comum da inautenticidade inútil. Tanto a alterreferência como a egorreferência, ambas partem do
pressuposto da negação do ser e, por isso, são referências negativas. Em outras
palavras o homem é o único ser que se recusa a ser quem ele é. Assim como Adão
se recusou a ser quem era e queria ser igual a Deus,
A
teoreferência é a terceira e ultima
grande demanda: “ser quem Deus quer que sejamos”. É o ato de tomar o
conhecimento de Deus como referência para a determinação do ser do homem. Todas
as outras são pseudoreferências por isso geram inautenticidade. Deus é a única
referência para uma vida autêntica, isto é, para o verdadeiro autoconhecimento.
A
autenticidade só é possível no conhecimento do Deus que nos conhece. É o
conhecimento de Deus que nos conscientiza de nossa revolta contra nós próprios,
uma revolta sempre pautada em referências negativas.
O
“homem revoltado” só pode ser reconduzido a partir de um conhecimento divino
mediante revelação. Em nós mesmos não há reposta, há apenas vazio e ausência completa
de Deus.
Quem Sou Eu? Dietrich Bonhoeffer
Quem sou eu? Freqüentemente me dizem
Que saí da confinação da minha cela
De modo calmo, alegre, firme,
Como um cavalheiro da sua mansão.
Quem sou eu? Freqüentemente me
dizem
Que falava com meus guardas
De modo livre, amistoso e claro
Como se fossem meus para comandar.
Quem sou eu? Dizem-me também
Que suportei os dias de infortúnio
De modo calmo, sorridente e alegre
Como quem está acostumado a vencer.
Sou, então, realmente tudo aquilo
que os outros me dizem?
Ou sou apenas aquilo que sei acerca de mim mesmo?
Inquieto e saudoso e doente, como ave na gaiola,
Lutando pelo fôlego, como se houvesse mãos apertando minha garganta,
Ansiando por cores, por flores, pelas vozes das aves,
Sedento por palavras de bondade, de boa vizinhança
Conturbado na expectativa de grandes eventos,
Tremendo, impotente, por amigos a uma distância infinita,
Cansado e vazio ao orar, ao pensar, ao agir,
Desmaiando, e pronto para dizer adeus a tudo isto?
Quem sou eu? Este, ou o outro?
Sou uma pessoa hoje, e outra amanhã?
Sou as duas ao mesmo tempo? Um hipócrita diante dos outros,
E diante de mim, um fraco, desprezivelmente angustiado?
Ou há alguma coisa ainda em mim como exército derrotado,
Fugindo em debanda da vitória já alcançada?
Quem sou eu? Estas minhas
perguntas zombam de mim na solidão.
Seja quem for eu, Tu sabes, ó Deus, que sou Teu!